Os brasileiros são caipiras?
Categoria: Literatura


Em tempos de polarização extrema em que a política brasileira parece se resumir a petistas e tucanos, uma declaração infeliz do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, feita ainda no século passado, sempre surge nas redes sociais e causa polêmica ao lembrar aos caipiras que o Jeca, que nunca existiu, ainda existe.
Na fala que surpreende por partir de um sociólogo, FHC declara, numa visita a Portugal, que depois de viajar para outros países havia descoberto que o brasileiro era caipira. A declaração demonstra preconceito e desinformação por parte do declarante que tentou se explicar depois atribuindo ao termo "caipira" outro significado que não o pejorativo.
Contextos e polêmicas à parte, o fato é que fica difícil acreditar em sua boa intenção ao chamar os brasileiros de caipiras. E se a intenção era nos diminuir com a palavra que nos identifica, ele reproduziu um estereótipo forjado nos confins da chamada Paulistânea e consolidado no século XX, emblematicamente, com Urupês, o livro em que Monteiro Lobato define o caipira como um ser indolente, vagabundo, doente e perigoso, uma espécie de verme.
Não tenho certeza do que realmente Fernando Henrique quis nos chamar, mas certamente não foi de caipira, não no sentido correto da palavra.
Apenas parte dos brasileiros é caipira, a que nasce ou adota o modo de vida cristalizado na Paulistânea que compreende os estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Espírito Santo e parte do Paraná. Os demais, na consistente definição de Darcy Ribeiro, no livro O Povo Brasileiro, são: caboclos, sertanejos, crioulos e gaúchos. Logo, chamar os brasileiros de caipira foi reduzir o Brasil à Paulistânea. Além disso, ser caipira não nos coloca abaixo de povo algum como parece ter sugerido o ex-presidente.
Ao contrário, nos eleva, não acima de ninguém, mas ao nível ideal para olharmos nos olhos de qualquer burguês que se julga superior e dividir com ele a relevância cultural que temos de sobra.
As três grandes culturas que formaram o Brasil se fundiram de forma tão intensa e complexa para formar o caipira que a compreensão do que somos escapa à capacidade cognitiva da burguesia. Sentindo mais o Brasil, o ex-presidente e sociólogo saberia que o uso do termo “caipira” no sentido pejorativo reduz o caipira ao Jeca Tatu (mero personagem literário mitificado) e despreza séculos de cultura, arte e História que a alma caipira ainda conserva, literalmente, em seu conservadorismo característico.
A distância entre o caipira e o Jeca é tão grande que ultrapassa os domínios da semântica. É muito maior, por exemplo, que a distância entre tucanos e petistas, que às vezes, como diria o caipira mais desbocado, não passa da distância entre a moita e a bananeira.
Na fala que surpreende por partir de um sociólogo, FHC declara, numa visita a Portugal, que depois de viajar para outros países havia descoberto que o brasileiro era caipira. A declaração demonstra preconceito e desinformação por parte do declarante que tentou se explicar depois atribuindo ao termo "caipira" outro significado que não o pejorativo.
Contextos e polêmicas à parte, o fato é que fica difícil acreditar em sua boa intenção ao chamar os brasileiros de caipiras. E se a intenção era nos diminuir com a palavra que nos identifica, ele reproduziu um estereótipo forjado nos confins da chamada Paulistânea e consolidado no século XX, emblematicamente, com Urupês, o livro em que Monteiro Lobato define o caipira como um ser indolente, vagabundo, doente e perigoso, uma espécie de verme.
Apenas parte dos brasileiros é caipira, a que nasce ou adota o modo de vida cristalizado na Paulistânea que compreende os estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Espírito Santo e parte do Paraná. Os demais, na consistente definição de Darcy Ribeiro, no livro O Povo Brasileiro, são: caboclos, sertanejos, crioulos e gaúchos. Logo, chamar os brasileiros de caipira foi reduzir o Brasil à Paulistânea. Além disso, ser caipira não nos coloca abaixo de povo algum como parece ter sugerido o ex-presidente.
Ao contrário, nos eleva, não acima de ninguém, mas ao nível ideal para olharmos nos olhos de qualquer burguês que se julga superior e dividir com ele a relevância cultural que temos de sobra.
As três grandes culturas que formaram o Brasil se fundiram de forma tão intensa e complexa para formar o caipira que a compreensão do que somos escapa à capacidade cognitiva da burguesia. Sentindo mais o Brasil, o ex-presidente e sociólogo saberia que o uso do termo “caipira” no sentido pejorativo reduz o caipira ao Jeca Tatu (mero personagem literário mitificado) e despreza séculos de cultura, arte e História que a alma caipira ainda conserva, literalmente, em seu conservadorismo característico.
A distância entre o caipira e o Jeca é tão grande que ultrapassa os domínios da semântica. É muito maior, por exemplo, que a distância entre tucanos e petistas, que às vezes, como diria o caipira mais desbocado, não passa da distância entre a moita e a bananeira.