Marcelo Dentão - Cap 1: Jogo do Bicho
- Pra quê trabalhar tanto?- dizia Carlinhos, companheiro do açougue.
- Num é tu que cuida de três fi né Carlim!
Mas que graça. Marcelo não se contenta em acordar 4 horas da matina para entregar jornal, garantindo assim as contas do mês. Para ele, esse emprego pagaria o principal: Seu jogo do bicho. O que vai além disso ele chama de “resto” – sim, isso inclui sua família.
- Esse jogo ainda vai te matá pai. – Disse-lhe seu “amor”, Jucelina.
- Ah mãe, vai cuidar daquela sua maldita horta. Aquilo tá mais fei que batê na mãe!
- Mas é claro, cê num me ajuda.
- Deve ser porque eu faço alguma coisa a num ser... a num ser nada né! Que cê num faz nada! E cala a boca que ainda não conferi meu jogo...
Enquanto Jucelina varria sua velha cozinha do casebre herdado de seus pais, a parede da sala encardida pela fumaça do picão de Dentão prendia toda a atenção de uma senhora que tinha uns 50 anos e um aspecto respeitável, óculos Rayban e calça boca de sino.
- A casa da senhora está muito bem organizada! Parabéns.
- Ai, que isso! – Assustou-se Jucelina – Tem gente aqui que nem presta atenção no quanto eu me esforço pra deixar esse barraco apresentável.
- É... Deve ser porque essa pessoa anda prestando atenção em outras coisas e não vê o que está perdendo...
- Mas o que é que você ta falando velha? – Retrucou Dentão.
- Nossa! Em algum momento eu te agredi verbalmente? Acho que não né. Mais respeito com os mais velhos, por favor.
- Ah senhora, você me desculpe. Mas é que eu tô tão estressado com essa merda de jogo do bixo. Eu nunca ganho nada! Mas eu tô sentindo que a sorte tá comigo.
- E é sobre isso mesmo que eu vim falar. Lembra que você deixou essa sua casa como garantia caso perdesse novamente o jogo? Sou a esposa de Bastião, e vim aqui pra resolver esse assunto com você. Tenho vários seguranças me esperando ali fora só esperando o meu sinal.
- Mas o que você fez seu maluco! Ai meu Deus, não leva a minha casa sinhorinha! Pelas minhas crianças! Onde nós vamos morar? – Implorava Jucelina.
- Há há. É impossível amiga. Eu não perco em negócios. Vou pedir uma única vez para que saiam pacificamente.
- Mas espera, - disse Marcelo, com tom de esperança- eu ganhei! Eu ganhei! Macaco! Macaco! Uhuuuul! Sai daqui sua bruxa maldita! – e esfregando o papel no rosto da senhora – Chupa essa!
- Bom - disse a senhora, pegando o papel da mão de Dentão – isso paga o que me deve. Assunto encerrado.
E assim a senhora deixou a casa da família amaldiçoada por Dentão, mas abençoada pelo jogo. Jucelina não se conteve:
- Aiiii, eu te amo meu Dentão!!!
- Ih... Agora você me ama né veia. – disse-lhe Marcelo dando uma leve gargalhada- Mas eu tô feliz.
- Promete pra mim que nunca mais vai jogar esse demônio de jogo!
- Eu prometo! Pela nossa família, eu prometo.
No outro dia, Dentão apostou de novo no macaco. Sim, ele perdeu.